Segundo pneumologistas de Ribeirão Preto, SP, o principal fator para o sucesso de quem pretende parar de fumar é a força de vontade individual. ‘A decisão não pode ser por pressão de terceiros.’
Com a chegada do novo ano, é comum que as pessoas estabeleçam novas metas e promessas a serem cumpridas e uma delas está ligada ao hábito de fumar.
Dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca) mostram que, no Brasil, cerca de 160 mil pessoas morrem todo ano por causas ligadas ao tabaco. Em todo o mundo, esse número chega a 8 milhões de mortes, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Parar de fumar não é simples. Segundo o médico pneumologista Luís Renato Alves, o primeiro passo para abandonar o cigarro é a vontade individual.
“O primeiro e mais importante ponto é a pessoa querer parar, precisa partir dela, não pode ser por pressão de terceiros. Isso é fundamental. Precisa colocar na cabeça que vai parar.”
Uma vez decidida, a pessoa enfrenta um processo que requer determinação, mudança de hábitos de vida e muito autocontrole.
1. Estabeleça uma data
Para o médico pneumologista Fabiano Luís Schwingel, que trabalha com fumantes e ex-fumantes há 20 anos, marcar uma data para parar de fumar é fundamental. “A parada depende de cada pessoa, mas o maior problema das pessoas é colocar prazo. Precisa ter um prazo, não existe casamento sem data marcada.”
A partir da data escolhida, o processo se torna individualizado. Schwingel explica que isso acontece porque as pessoas possuem sensibilidades e níveis de estresse diferentes relacionados ao vício, e por isso, não é possível estabelecer uma única estratégia para todos os fumantes.
“Tem pessoas que têm outros distúrbios psiquiátricos associados, e tirar o cigarro [abruptamente] pode desencadear pânico, surtos de natureza psicótica, etc. Quem faz usos de antidepressivos, por exemplo, precisa individualizar o tratamento, pelos riscos que ele corre na hora de parar. Tudo depende do paciente, e não da técnica preferida pelo médico.”
A opção pela parada repentina ou uma redução gradual, com ou sem uso de medicação, vai depender de fatores individuais de cada paciente, mas tudo isso é feito pensando na data escolhida para o corte.
“Naquele dia em que você vai parar, é o dia. Você pode até fazer uma redução gradual antes daquele dia, pode fazer medicação e tudo mais, mas aquele dia marcado não tem negociação,” diz Schwingel.
Um total de 443 brasileiros morrem todos os dias por causa do tabagismo, segundo o Inca — Foto: GETTY IMAGES/BBC
2. Entenda a abstinência
Ao parar de fumar, a pessoa entra em um processo conhecido como abstinência. A nicotina presente no cigarro age no sistema nervoso central dando uma sensação de prazer, de bem-estar, que induz ao vício.
A abstinência é causada justamente pela falta da nicotina no organismo.
“É normal, no pós-parada imediata, a pessoa sentir nervosismo, ansiedade, insônia e uma série de efeitos decorrentes da abstinência. Os primeiros dias normalmente são os piores, mas conforme o tempo avança, os sintomas ficam mais leves”, diz o médico Luís Renato Alves.
Para Fabiano Schwingel, é importante que a pessoa entenda que a abstinência é uma parte essencial do processo, e que mesmo com medicações e trocas, não existe chance de conseguir parar de fumar sem passar por ela.
“É preciso entender que não existe parar de fumar sem passar pela abstinência. As pessoas querem evitar o sofrimento a todo custo, mas isso não existe. É um sofrimento que vai te trazer mais qualidade de vida e longevidade. Não precisa ter medo dos sintomas.”
Segundo os médicos, as primeiras três semanas são as mais críticas em relação aos sintomas e requerem, além de mais força de vontade do fumante, mais atenção das pessoas em volta.
“As pessoas da casa precisam ter em mente que as primeiras três a quatro semanas serão difíceis. O paciente terá insônia, ficará mais irritado, e terá uma compulsão maior por comida, já que o gosto da comida muda sem o cigarro. A ajuda dos familiares para controlar essa compulsão é fundamental. Para quem tem hipertensão, durante o início do processo é interessante acompanhar mais de perto a pressão arterial, e especialmente nos primeiros dias, fazer ajuste na medicação,” alerta Schwingel.
Atividade física é um dos hábitos de vida que podem ajudar no processo de parar de fumar — Foto: Michael de Groot para Pixabay
3. Faça trocas
Para o médico Luís Renato Alves, é preciso entender o que leva o fumante ao cigarro, e planejar maneiras de diminuir esses caminhos no dia-a-dia. “Tem que parar e prestar atenção, no dia a dia, naquilo que te faz fumar mais, e tentar dissociar isso do cotidiano.”
Se o vício em cigarro está ligado à sensação de prazer proporcionada pela nicotina no organismo, é importante fazer a troca do fumar por outros hábitos que também sejam prazerosos.
“Precisa obrigatoriamente mudar hábitos, encontrar coisas que te dão a mesma satisfação que o cigarro daria. E isso é muito individualizado. Tem gente que vai para a atividade física, tem quem vá tocar um instrumento, tem quem vá ler, fazer ação social, qualquer coisa que ajude a evitar que a pessoa fique pensando no cigarro. A consulta médica pode ajudar a dar um direcionamento na busca por essa substituição”, explica Fabiano Schwingel.
Hábitos como a prática de exercícios físicos são importantes aliados no processo de parar de fumar, uma vez que a atividade proporciona descargas de adrenalina e liberação de endorfinas, que compensam a falta da nicotina.
Entre as opções, a caminhada é muito indicada pelos especialistas, desde que haja liberação de um médico para a prática.
Compulsão alimentar é um risco para o qual fumantes precisam ficar alertas durante o processo de parar de fumar. — Foto: Rodrigo Sargaço/EPTV
Schwingel ainda indica aos pacientes que se atentem para a compulsão pela fase oral, causada pelo hábito do fumante de levar o cigarro à boca.
“Uma dica que eu sempre dou para meus pacientes é ir ao mercado de produtos naturais e pegar coisas com gostos mais fortes, como cravo, canela, gengibre e frutas secas sem açúcar. Você pode ficar mascando isso para controlar a compulsão pela fase oral.”
O especialista alerta para o cuidado em escolher produtos sem açúcar, para evitar o desenvolvimento da compulsão por comida, que pode levar a um ganho de peso.
Luís Renato Alves também concorda que, durante o processo de parar de fumar, é preciso ficar atento à alimentação e à ingestão de água, principalmente.
“O ganho de peso geralmente acontece por conta da ansiedade. A pessoa está ansiosa pela falta de cigarro e acaba comendo mais, principalmente doces. Outro fator importante é que o ato de fumar faz com que o metabolismo fique um pouco mais acelerado, e quando você tira esse fator, esse fator também pode influenciar no peso. Por isso, a gente orienta algumas coisas, como o cuidado na alimentação e uma hidratação vigorosa.”
Cigarro sendo aceso — Foto: Reprodução/EPTV
4. Mantenha-se vigilante
Uma vez superada a fase crítica da abstinência, os sintomas tendem a diminuir de forma gradual. Para os especialistas, é fundamental que o ex-fumante entenda que mesmo que o incômodo desapareça, a determinação do início do processo precisa permanecer.
Fabiano Schwingel explica que o vício no cigarro causa modificações no cérebro, que não se esquece da sensação de prazer causada pela nicotina. “Quando você fica muito tempo sem fumar, seu cérebro começa a pedir de novo, mas se pegar o primeiro cigarro novamente, o vício volta. Não pode pegar o primeiro e precisa manter os subsídios de controle.”
Luís Renato Alves acredita que evitar a exposição ao cigarro é um fator essencial para se manter sem fumar pelo resto da vida. Segundo ele, a maioria das recaídas acontece porque, depois de um longo período sem fumar, a pessoa acha que já está imune e volta a se aproximar do cigarro.
“Uma vez sem cigarro, sempre sem cigarro. Isso acontece muito, a pessoa consegue ficar um bom tempo sem fumar, mas depois acaba voltando, porque um dia experimentou um diferente. Em uma semana, ela já está fumando um maço de novo. Evitar locais próximos de fumantes é uma medida importante também, porque isso gera um efeito visual que dá vontade.”
Fazer acompanhamento antes e depois do processo de parar de fumar é essencial para garantir mais saúde. — Foto: Tempura/Getty Images via BBC
5. Faça acompanhamento médico
O processo de parar de fumar pode acontecer com a ajuda de medicamentos. Nesses casos, o acompanhamento médico é imprescindível, uma vez que a maioria dos remédios disponíveis precisam de receita médica.
Segundo Alves, existem duas classes de medicamentos disponíveis para quem pretende parar de fumar. A primeira é a própria reposição da nicotina, em doses progressivamente menores, através, por exemplo, dos adesivos e gomas de mascar que podem ser encontrados em farmácias e não precisam de receita médica.
A segunda consiste em medicações capazes de agir no sistema nervoso central para diminuir a sensação de dependência da nicotina, como antidepressivos e ansiolíticos. O uso desses medicamentos precisa necessariamente ser indicado e acompanhado por um médico.
“Uma parte dos remédios precisa de avaliação e receita médica, não basta apenas usar a medicação. Parar de fumar envolve um processo enorme e a medicação é apenas uma parte dela. Só o remédio não resolve a vontade de fumar”, explica.
Alves ainda reforça que, uma vez que parou de fumar, o ex-fumante precisa fazer acompanhamento médico regular, para minimizar e prevenir complicações decorrentes do período em que fumou.
“Quando a pessoa para de fumar, ela tem efeitos imediatos de melhora na saúde, mas alguns riscos, como desenvolvimento de câncer e doença cardiovascular, persistem mesmo depois que ela parou de fumar. É importante fazer acompanhamento para prevenir o surgimento de problemas sérios.”